Foi recentemente publicado um caso de sucesso de transplantação de sangue do cordão umbilical numa criança com uma doença genética rara, que se manifesta habitualmente entre os 5 e os 12 anos de idade e que conduz a incapacidade grave e morte prematura.
O crescimento da criança decorreu de forma normal até aos 18 meses, altura em que os pais começaram a notar um padrão de comportamento repetitivo, com reduzido contacto visual, e que conduziu ao diagnóstico de perturbação do espectro do autismo. Mais tarde, aos 6 anos de idade, o menino apresentou-se para observação no hospital devido a um quadro de estrabismo no olho esquerdo e fala arrastada. O exame oftalmológico não revelou alterações na retina ou no nervo ótico, no entanto, os exames físico e neurológico detetaram alterações na coordenação motora, quando a criança estendia os braços em direção a um ponto de interesse. A ressonância magnética ao crânio revelou lesões neurológicas consistentes com os resultados da análise genética subsequentemente realizada, que indicou a presença de uma mutação genética herdada da mãe, estabelecendo o diagnóstico de adrenoleucodistrofia ligada ao cromossoma X.
A adrenoleucodistrofia é uma doença genética provocada por uma mutação num gene localizado no cromossoma X, que causa alterações no sistema nervoso e nas glândulas suprarrenais. Afeta cerca de 1 em cada 14.700 bebés, geralmente do sexo masculino. A forma cerebral juvenil manifesta-se habitualmente em meninos com idade entre 5 e 12 anos, anteriormente saudáveis, podendo primeiramente apresentar-se sob a forma de défice cognitivo moderado, seguido de alterações na visão, audição e função motora, eventualmente conduzindo a um estado de incapacidade severa e morte prematura. O transplante de células estaminais hematopoiéticas, como as que se encontram no sangue do cordão umbilical e na medula óssea, é a intervenção convencionalmente aceite para o tratamento desta doença. Deve ser realizado numa fase inicial, no sentido de impedir a progressão da lesão neurológica e o agravamento dos sintomas.
Sangue do cordão umbilical trava progressão de doença genética incapacitante em criança de 6 anos
No seguimento da deteção de lesões neurológicas em estado avançado, o menino foi imediatamente referenciado para transplante hematopoiético, o único tratamento capaz de travar a progressão da doença. Após ser sujeito a quimio e radioterapia (esta última com o cuidado de não irradiar o crânio, para não agravar a lesão neurológica), o menino foi transplantado com sangue do cordão umbilical de um dador compatível. Teve alta do hospital 65 dias depois do transplante e, passados mais de dois anos, encontra-se estável, sem agravamento dos sintomas. Os resultados da ressonância magnética mostraram estabilização das lesões neurológicas, sem progressão durante os 2 anos após o transplante de sangue do cordão umbilical.
Os autores referem que este foi um caso bem-sucedido do tratamento de adrenoleucodistrofia cerebral, e sublinham a importância do sangue do cordão umbilical como fonte de células estaminais para o tratamento desta doença, em que o transplante deve ser realizado o mais rapidamente possível, para evitar a deterioração do estado do doente.
Referências:
Yada Y, et al. Brain-sparing cord blood transplantation for the borderline stage of adrenoleukodystrophy. Mol Genet Metab Rep. 2021.28:100778.
https://www.orpha.net/consor/cgi-bin/OC_Exp.php?Lng=PT&Expert=43, acedido a 8 de julho de 2021.
https://www.omim.org/entry/300100, acedido a 9 de julho de 2021.